quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Trabalho 2 - Centrais de Negócios

Título: Centrais de negócios: oportunidades para supermercados
Autores: Rodrigo Guimarães Motta e Kleber Cipriani
Publicado: Capítulo do livro "Estratégias de marketing para varejo" da Editora Novatec
Ano: 2007
Obs - assim como o artigo anterior, este não contém gráficos, quadros e tabelas, por questão de formatação. Para ter acesso aos mesmos, recomenda-se a aquisição do livro!

Introdução

Com o crescimento das grandes redes supermercadistas, os pequenos supermercados enfrentam um dilema, como sobreviver em um ambiente competitivo dominado por concorrentes muito fortes. É possível que não haja uma única resposta para isso, porém uma delas são as centrais de negócios, que propõe que diversas atividades comerciais, logísticas e administrativas sejam feitas em conjunto por um grupo de supermercados, com o objetivo de ganhar eficiência e competitividade.

1. O Varejo alimentício

O varejo alimentício é aquele canal de distribuição onde os consumidores se abastecem de produtos como alimentos, bebidas e de higiene e limpeza para suas necessidades diárias. Esse canal é composto por dois tipos de varejo. Um deles são os auto-serviços, que são aqueles estabelecimentos onde os clientes pegam nas gôndolas os produtos que os interessam. Os auto-serviços do varejo alimentício são popularmente conhecidos como supermercados e podem ser organizados de acordo com o porte de cada loja. Essa divisão é feita através do número de caixas registradoras, ou checkouts que o supermercado possui. Os supermercados de menor porte são também chamados de minimercados, enquanto as grandes lojas são conhecidas como hipermercados.

O outro tipo de varejo alimentício são os clientes tradicionais, que tem esse nome porque essa configuração varejista surgiu antes dos supermercados, são aqueles locais onde é necessário solicitar os produtos desejados, já que os mesmos encontram-se atrás de um balcão onde os consumidores são atendidos pelos proprietários ou por funcionários do varejo. Esses clientes tradicionais podem ser mercearias ou padarias, ainda que essas últimas cada vez mais se convertam em auto-serviços.

Hoje no Brasil, assim como já aconteceu nos Estados Unidos e na Europa, segundo o instituto de pesquisa AC Nielsen, a maior parte das vendas do varejo alimentício estão concentradas em auto-serviços, que representam 86,1% das vendas totais, com destaque para as lojas de grande porte.

2. Os supermercados

Os supermercados no Brasil constituem hoje uma dos segmentos da economia com maior representatividade. Segundo o último ranking da ABRAS (Associação Brasileira de Supermecados), o número de lojas, faturamento, número de empregados, área de vendas e quantidade de checkouts tem aumentado ano a ano, enquanto a participação do setor no produto interno bruto (PIB) brasileiro tem sido constantemente superior a 5% .

Segundo Parente (2000), há diversas tendências que vem impactando os varejistas nos últimos anos. Duas delas merecem especial atenção, o aumento da globalização dos supermercados e a consolidação das grandes redes supermercadistas, que serão estudados com maior detalhe a seguir.

a) Globalização das grandes redes supermercadistas

A globalização do varejo tem se acelerado de forma constante ao longo dos últimos anos. Kumar (2004) destaca que estudo realizado em 2002 levantou que os cinco principais varejos globais representavam 21% das vendas de bens de consumos, percentual que subiu para 32% em 2004 e pode chegar a 45% ao final de 2005. Segundo Randall (1994), as principais razões para essa globalização são: a necessidade de negociar melhores condições com grandes fabricantes de bens de consumo que iniciaram seu processo de globalização há mais tempo e a saturação de mercados mais maduros como o mercado americano e o europeu. Seguindo essa tendência, grandes redes multinacionais, atraídas pelo tamanho do mercado brasileiro, iniciaram suas operações aqui no Brasil e já tem uma representação significativa no mercado. O Carrefour (França) entrou na década de 70, o SONAE (Portugal) começou a operar na década de 80 e o Wal Mart (EUA) veio para o Brasil nos anos 90. A própria Companhia Brasileira de Distribuição, detentora das bandeiras Extra, Pão de Açúcar e Compre Bem, tem participação acionária do grupo francês Casino, desde 1999. Segundo Gouvêa de Souza (2004), essas empresas multinacionais exercem pressão cada vez maior nos fabricantes por um atendimento melhor e principalmente por preços mais competitivos. Sua participação em 2002 chegou a 50,4% entre os 20 maiores supermercados do Brasil.

b) Consolidação das redes de supermercados

O processo de globalização, segundo Parente (2000), acelerou a consolidação dos supermercados brasileiros. As redes presentes no Brasil, tanto multinacionais quanto nacionais, iniciaram em anos recentes um esforço significativo para aumentar sua força nas negociações com os fornecedores e também reduzir seus custos fixos. O caminho para atender a essa necessidade foi a aquisição de redes pequenas ou em dificuldades pelos concorrentes mais agressivos. De acordo com o ranking da SuperHiper de 2004, 40 % das vendas totais dos supermercados já é realizado pelas cinco principais redes. É importante observar que entre esses gigantes do varejo, apenas a quinta maior rede, a gaúcha Zaffari, é um empreendimento com capital 100% nacional, enquanto as demais são empresas multinacionais ou com forte presença de capital estrangeiro em sua composição acionária.

Segundo Gouvêa de Souza (2004), esse crescimento, ainda que significativo, ainda é inferior ao visto em outros países, independente desses serem desenvolvidos (Itália, Espanha, Alemanha, França, Reino Unido) ou em desenvolvimento (Chile, Argentina, Colômbia e México). Este dado é ratificado pela aquisição do Bom Preço pelo Wal Mart, e pelo aumento da participação do grupo francês Casino no CBD, ambos as negociações realizadas em 2005.

3. Os pequenos supermercados

Pressionados pelas grandes redes de supermercados, muitos negócios de menor porte fecharam as suas portas ou foram vendidos para os grandes concorrentes. Para àqueles empresários que decidiram continuar seu negócio no varejo, um grande questionamento se fez: como se manter competitivo?

Uma resposta sem dúvida difícil de ser formulada, visto que as grandes redes de supermercados, através dos processos de globalização e consolidação vistos anteriormente, possuem uma série de vantagens competitivas, entre as quais:


a) Poder de barganha

Com um número representativo de lojas no Brasil e em outros países, as grandes redes podem negociar preços mais competitivos com os fornecedores e repassar uma parte desse ganho para o consumidor final. Desta forma, seus preços tendem a ser melhores do que os oferecidos em pequenos supermercados independentes.

b) Marketing

Com verbas de marketing cada vez maiores, em função do aumento do aumento do faturamento, as redes podem desenvolver anúncios na TV e em outros veículos de mídia, tablóides com ofertas promocionais e todas as demais ferramentas de marketing que o varejo pode dispor. Esse esforço também não pode ser acompanhado pelo pequeno supermercado, que fica com menos exposição aos consumidores do que seus concorrentes de maior porte.

C) Logística & Administração

Os grandes varejistas, com amplos recursos disponíveis, podem contratar profissionais mais qualificados, consultorias especializadas e adquirir ferramentas para uma gestão mais efetiva do seu negócio. Já os pequenos supermercados, sem os mesmos recursos enfrentavam esse movimento rumo à profissionalização com estruturas familiares onde o proprietário, com pouca ou nenhuma formação acadêmica, tomava todas as decisões e o negócio era gerenciado por membros da família. Kumar (2004, p. 111) reforça esse ponto:

“... a maioria dos varejistas, revendedores e franqueados eram locais e fragmentados. Dentro de cada país, havia um enorme setor de distribuição operado pelos próprios donos, o que no varejo denominamos “comércio familiar”. Portanto o varejo, ou mais genericamente, a distribuição, adquiriu a imagem de um ramo de negócios simples, sem sofisticação, que não necessitava de mentes superiores e treinadas ou de MBAs de escolas de prestígio.”

Com o tempo e com o estudo de casos de sucesso no exterior, os pequenos empresários perceberam que uma alternativa a esse cenário não muito animador era a união de forças entre suas empresas. Surgiam as Centrais de Negócios.

4) Centrais de Negócios

Para aumentar sua competitividade, uma empresa de qualquer segmento deve buscar a inovação, que é o processo onde, idéias destinadas a alavancar o negócio, surgidas da criatividade dos gestores, são implementadas e alteram a configuração das empresas. Segundo Vico Manas (2001), as inovações podem ocorrer em quatro áreas distintas da empresa: empreendimento, estrutura, tecnologia e comportamento.

Diversas pesquisas realizadas (Kuczmarski, Middlebrooks e Swaddling, 2001; Tidd, Bessant e Pavitt, 2001), demonstram que as empresas inovadoras, que inovam constantemente em seu dia-a-dia, tem performance melhor que as demais empresas. Dentro dessa matriz, as Centrais de Negócios são uma inovação completa, pois alteram como será visto a seguir o empreendimento, a estrutura, a tecnologia e o comportamento dos varejistas que delas se associam.

Gouvêa de Souza (2004, p. 34) define uma Central de Negócios como sendo “Operador que, dispondo de recursos econômicos e pessoa jurídica, tem como objetivo desenvolver atividades e prestar serviços às empresas independentes que, com espírito de cooperação, tenham-se associado à sua organização mediante uma regulamentação interna, para melhorar sua posição competitiva no mercado”. Pode-se assim dizer que os pequenos supermercados, pressionados pela concorrência, se associam e constituem uma outra empresa, que é uma Central de Negócios, responsável por incentivar os negócios dos associados. Existem também Centrais de Negócios que são fomentadas por grandes atacados, que buscam aumentar a fidelidade de seus clientes, oferecendo para eles o mesmo suporte que é fornecido por uma Central constituída por pequenos varejistas, com a vantagem que toda a estrutura organizacional da Central já está constituída e as negociações com os fornecedores são suportadas pelos compradores dos atacados, com seu grande poder de barganha. Com essa configuração, há exemplos significativos, como o atacado Martins, que organiza a Rede Smart e o atacado Peixoto, responsável pela Rede Valor.

O autor citado anteriormente coloca que são deveres da Central, “fornecer informações, gerar negócios, defender os associados nas negociações com fornecedores, divulgar o associado e ser totalmente transparente frente aos mesmos associados”. Esses, por sua vez, devem pagar mensalidades para sustentar a Central, comparecer a reuniões, obedecer ao estatuto da Central, ser fiel a Central da qual for associado, não ficar inadimplente perante os fornecedores que a central negocia e aceitar as padronizações dos negócios estipuladas pela maioria dos associados.
Há negócios em que uma rede de empresas atua com maior grau de entrosamento e parceria, sem que, todavia se constituam em uma Central de Negócios, como por exemplo cooperativas, redes com filiais, associações comerciais e franquias.

Segundo uma adaptação livre feita do estudo de Gouvêa de Souza (2004), o ciclo de vida das Centrais de Negócios pode ser dividido em três fases distintas: o início, o desenvolvimento e a maturidade, cada uma com características distintas.

As Centrais de Negócios em seu estágio inicial, têm como foco negociar condições comerciais mais vantajosas com os grandes fornecedores, como Nestlé, Unilever, Coca-Cola. Com um escritório independente, que responde pela negociação dos associados, a Central passa a ter um poder de barganha significativo e passa a buscar aproximar os seus preços de custo (e por conseqüência de revenda) aos preços praticados pelas grandes redes. Além de preços melhores, nem sempre esses grandes fabricantes tem estrutura ou interesse em atender pequenos supermercados, sendo assim a entrada em uma Central de Negócios pode permitir ao associado oferecer um mix de produtos mais atrativo para os seus consumidores, com a presença de um maior número de marcas líderes. Reside nessa dinâmica os principais motivos para um supermercado independentes se associar a uma Central.

Porém mesmo essa aparente grande vantagem encontra uma série de dificuldades. Como podem ter suas margens comprometidas pelo oferecimento de maiores descontos a esses varejistas, as indústrias podem tentar conduzir negociações em paralelo com cada varejista membro da Central. Isso é de certa forma facilitado pela legislação brasileira, que não incentiva as compras centralizadas por uma central, já que ao fazer isso, o repasse da mercadoria do depósito da central aos varejistas deve ser novamente tributado, o que acaba por encarecer o produto. Para evitar que isso aconteça, os produtos devem ser entregues em cada uma das lojas dos pequenos varejistas, o que gera mais restrições por parte da indústria, já que essa não tem os ganhos logísticos de realizar uma entrega centralizada em um único depósito. Desta forma, as indústrias continuam a enviar seus vendedores para tentar fechar as negociações junto a cada varejista, que por não acompanhar diretamente a negociação na central e por ser diariamente pressionado por concorrentes e consumidores, pode acabar fechando o negócio. Isso explica em parte o fato observado no estudo realizado pro Gouvêa de Souza, que apontou que apenas 36% do total de compras feita por um associado de uma Central de Negócios é conduzido pela Central, enquanto o restante é feito diretamente pelo associado.

No estágio seguinte, chamado de desenvolvimento, as Centrais de Negócios compartilham serviços de administração e de marketing. Por serviços de administração, entende-se que a Central busca oferecer serviços especializados de administração, tributários, contábeis, financeiros e de análises de resultados. Como coloca o consultor Gouvêa de Souza na revista SuperVarejo (Outubro de 2004, p.21), “Após conseguirem nível razoável de integração entre os lojistas, o foco passa a ser a união de serviços compartilhados, especialmente de marketing e financeiros”.

Além disso, para garantir o padrão de trabalho e de atendimento entre as diversas lojas que constituem a Central, a mesma incentiva e efetua treinamentos com as equipes operacionais e gerenciais dos membros, além de apoiar os esforços de recrutamento e seleção. Há, porém muito a ser feito ainda nesse sentido no Brasil, visto que o percentual de padronização desses é baixo. Apenas 19% das Centrais têm padronização total do treinamento operacional, mesmo percentual obtido quando se verifica a padronização total do treinamento gerencial. Já a padronização total dos processos de recrutamento e seleção é ainda inferior, sendo de 11%.

No estágio de desenvolvimento as Centrais se esforçam também para desenvolver um calendário integrado de marketing, de forma a estabelecer um padrão de qualidade no relacionamento com os consumidores. Por se tratar de lojas de varejo, o ponto de partida desse trabalho é a padronização dos pontos de venda, que pode englobar a fachada, a comunicação visual interna, o layout, entre outros pontos. A pesquisa realizada pela SuperHiper mostra que, se por um lado as fachadas hoje já passaram por alguma padronização, a comunicação visual interna não evoluiu tanto e os layouts permaneceram inalterados na maior parte dos membros das centrais.

As ferramentas de marketing mais utilizadas pelos supermercados, como tablóides, anúncios em jornais, revistas e TV, além de ofertas especiais em loja são desenvolvidas em conjunto por todos os integrantes da Central. Tablóides são lâminas que contém uma relação de produtos ofertados durante um período determinado, que são entregues em domicílios, na rua e na entrada das lojas. Anúncios em revistas e em TVs anunciam produtos com preços especiais nos veículos de comunicação com maior impacto perante o público-alvo do varejo que opta por esse tipo de ação.
Esse item requer um esforço de coordenação muito grande por parte dos negociadores da Central junto aos fornecedores, uma vez que os produtos promovidos devem possuir uma condição especial para serem atraentes perante os consumidores e versus a concorrência, além do que frequentemente os mesmos fornecedores, além de condições de preço, podem assumir parte ou a totalidade dos investimentos no desenvolvimento das ferramentas de marketing, que aumentam a atratividade não só dos supermercados, mas também dos produtos ofertados.
Há ainda uma ferramenta de marketing mais complexa para ser desenvolvida, porém que é muito utilizada como fonte de fidelização dos consumidores, que são as marcas próprias, que são aquelas desenvolvidas e comercializadas exclusivamente por um determinado varejista. Segundo Randall (1994), os varejistas conceberam e incentivaram o crescimento de marcas próprias para fidelizar seus consumidores e assim escapar de guerras de preços com concorrentes. Por serem produtos de boa qualidade comercializados por um preço um pouco inferior ao das marcas líderes, representam uma ameaça às marcas comercializadas pelas indústrias. Parente (2000) aponta que, apesar de representarem apenas 6% das vendas no Brasil, enquanto que na Inglaterra respondem por 29,7%, os varejistas vem dedicando cada vez mais atenção ao seu desenvolvimento. As Centrais de Negócios já vem efetuando um esforço para possuir marcas próprias, visto que segundo a pesquisa realizada pela SuperHiper, 57% já possuem, 32% não possuem mas pretendem possuir e apenas 11% não possui nem tem interesse em ter marcas próprias em seu portfolio.

Finalmente, no estágio de maturidade, as Centrais de Negócios tem os seus processos formalizados, desenvolve métodos (os quais a legislação brasileira oferece dificuldades, como visto anteriormente) para fazer um abastecimento centralizado e ter conseqüentes ganhos logísticos, integra os sistemas de todas as lojas para aumentar a eficácia da gestão e é gerida por um gestor profissional, que se dedica com exclusividade a gerência da Central de Negócios sob sua responsabilidade.

Segundo Gouvêa de Souza (2004) as Centrais de Negócios no Brasil se encontram em sua maioria no estágio inicial, com algumas iniciativas bem-sucedidas empreendidas no estágio de desenvolvimento, o que é natural visto que as Centrais no Brasil possuem apenas vinte anos de idade. Em países onde as Centrais existem há mais tempo, como é o caso da Espanha e da Itália, as Centrais estão majoritariamente em estágios mais adiantados, existindo algumas que inclusive já se encontram em sua maturidade.

5. O Crescimento das Centrais de Negócios

As Centrais de Negócios dentro do varejo alimentício vem crescendo ano após ano. Segundo a revista SuperHiper, o faturamento que foi de R$ 2 bilhões de reais em 2.000, em 2.004 chegou a mais de 12 bilhões de reais. O número de Centrais acompanhou o avanço das vendas, e passaram de 60, que atendiam a 1.500 lojas, para 150, que atendem a 2.807 lojas em todo o Brasil.

O conceito das Centrais de Negócios encontra-se espalhado pelas diversas regiões geográficas do Brasil. O ranking da SuperHiper, por exemplo, mostra que entre as dez principais Centrais de Negócios, há representantes das regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste.

Assim como outras inovações empreendidas no ramo varejista, as Centrais de Negócios tiveram campo para se desenvolverem dentro do setor supermercadista. Em parte devido ao sucesso nesse canal, como também pelos resultados obtidos em outros países do mundo, há hoje diversos outros segmentos varejistas que possuem suas Centrais de Negócios. Gouvêa de Souza (2004) detectou Centrais de farmácias, lojas de material de construção, lojas de móveis, padarias e papelarias.

Apesar do crescimento impactante do conceito de Central de Negócios, há uma série de dificuldades que retardam o crescimento desse modelo de negócios. Já foi apresentado anteriormente alguns dos principais problemas que as Centrais enfrentam e que estão ratificados na pesquisa realizada pela Revista SuperHiper, como a dificuldade imposta pelo sistema tributário brasileiro, a falta de interesse dos fornecedores em estimular e desenvolver Centrais fortes que podem exigir melhores condições para comercializar os seus produtos e dos poucos avanços feitos em alguns itens da padronização entre os associados, porém a principal dificuldade detectada pelos próprios associados (e que talvez seja a origem em parte das outras dificuldades), é o choque cultural entre as diferentes empresas que compõe a Central, que foi mencionado como uma dificuldade por 70,3% das Centrais entrevistadas.

Essa dificuldade cultural pode ser entendida se for considerado o fato da quase totalidade dos supermercados independentes que constituem uma Central de Negócios ser um pequeno negócio familiar, gerenciado pelo proprietário e sua família. Acostumado a decidir e a dar a palavra final nas principais decisões comerciais de sua empresa, o proprietário, por mais que reconheça os benefícios que a associação a uma Central pode oferecer, tem dificuldades em acatar decisões tomadas pela Central e que não estejam de acordo com a forma com que esse sempre gerenciou o seu varejo. Como é colocado pelo consultor João Luiz Avelatto (SuperHiper, Setembro 2005), “ainda existe o ranço cultural e ele é alimentado pelas vaidades das associadas. Vencidas essas vaidades, as redes caminharão rapidamente para soluções operacionais, financeiras, administrativas e de gestão (...) Colocar na mesma mesa associados com diferenças gritantes de gestão e operação cria certamente conflitos insolúveis”.

6. Perspectivas das Centrais de Negócios

As Centrais de Negócios dentro do setor supermercadista devem continuar crescendo nos próximos anos, visto que ainda há um número muito grande de pequenos supermercados independentes que necessitam estar associados a uma Central para poder fazer frente à concorrência das grandes redes multinacionais e nacionais presentes com cada vez mais força no Brasil. Isso implica na criação de Centrais nos diversos estados onde essas já existem ou não, com um número cada vez maior de participantes.
Como foi observado, apesar de não ser o foco desse artigo, as Centrais que já estão se expandindo para outros segmentos varejistas, devem continuar com esse movimento, em sincronia com o que está acontecendo com os supermercados.
Em função das dificuldades que existem nesse processo e que foram mencionadas nesse artigo, é possível que as associações supermercadistas, as quais têm muita força no Brasil, devem apoiar seus associados nesse movimento, com informações, treinamento e ferramentas de gestão. Esse ponto é ratificado pela relevância que o tema tem obtido nas publicações especializadas do setor, já tendo sido capa das principais publicações voltadas para o setor supermercadista.
Além das associações, consultorias especializadas devem surgir e oferecer os seus serviços aos pequenos supermercados interessados em organizar-se dentro do conceito de Centrais. Os aprendizados do passado, multiplicados por associações e consultorias, sugerem que o avanço das Centrais deve ser cada vez mais rápido e mais efetivo.

As dificuldades estruturais para a expansão das centrais, contudo, não podem ser desprezadas e tem que ser enfrentadas organizadamente e de forma consistente pelos associados às Centrais. A cultura de um pequeno empresário 100% responsável pelo seu negócio, que impede a aceitação dos conceitos das Centrais por parte de seus membros, não será eliminada do dia para a noite. É necessário que as principais Centrais já existentes consolidem o seu sucesso e sirvam de exemplo para as demais, além da realização de workshops, feiras e debates que apresentem aos supermercadistas quão efetivo o conceito de Centrais pode ser, se bem aplicado.

Os fornecedores também não devem facilitar a vida das Centrais, porém a tendência é que a consolidação das Centrais torne esses fornecedores mais dispostos a buscar alternativas para o desenvolvimento em conjunto dos seus negócios e das Centrais. Como coloca Gouvêa de Souza (2004, p. 162):

“O papel dos fornecedores também deverá ser marcante. Vencida a barreira inicial de desconfiança, eles devem perceber os benefícios no seu relacionamento com as centrais existentes, estimulando-os a tornarem-se promotores de novas iniciativas e permitindo, assim que eles aperfeiçoem não só o modelo de comercialização, mas também o de distribuição”.
No que diz respeito às dificuldades, as barreiras tributárias talvez sejam a dificuldade mais difícil de ser superada, pois para uma alteração na legislação é necessário grande organização das associações da classe supermercadista e das Centrais de Negócios, que devem se aliar com políticos dos diferentes poderes e que tem condições de suportar uma iniciativa desse porte. Se for analisada a força do setor supermercadista, mesmo essa complexa negociação deve ser bem-sucedida, ainda que demore algum tempo para ser levada a cabo.

As Centrais de Negócios promoveram inovações nas quatro áreas possíveis dessas ocorrerem. No empreendimento, pois aumenta o mix de produtos comercializados e os preços praticados. Na estrutura, já que para existir, uma Central de Negócios necessita de uma empresa independente que lidere o seu desenvolvimento e o afine com os associados e fornecedores. Na tecnologia, pois reorganiza os principais processos dos supermercadistas, como compras, marketing e logística. E no comportamento, pois para ser bem-sucedida uma Central deve superar a barreira cultural, anteriormente mencionada como fator restritivo a implementação total desse modelo.

Como o Brasil encontra-se ainda no estágio inicial da constituição desse formato de negócios, pode-se esperar que as inovações já realizadas se aprofundem significativamente e que nos próximos anos muitas Centrais já estejam em estágios mais adiantados do ciclo de vida de uma Central.

Finalmente, assim como já está acontecendo com fornecedores e grandes redes supermercadistas, pode-se esperar pela chegada com força no Brasil das grandes Centrais de Negócios multinacionais. Se for considerado o poder de investimento das multinacionais, mesmo as mais efetivas Centrais com atuação exclusivamente em um país tem uma força insuficiente para manter os seus associados competitivos com seus concorrentes de grande porte e aptos a empreender efetivas negociações com as multinacionais de bens de consumo.

No Brasil já há a presença, ainda modesta de uma dessas centrais a IGA (Independent Grocers Alliance) que foi trazida para o Brasil por um grupo de atacadistas e distribuidores. Esse processo, ainda que irreversível se for considerada a força da globalização econômica, deve acontecer de forma paulatina, pela complexidade da realidade brasileira e de suas diferenças significativas com mercados onde essas Centrais multinacionais já estão presentes de forma mais significativa, como os Estados Unidos.

Esse trabalho apresenta aos leitores os principais conceitos e a relevância de um tema que impacta os negócios de muitas indústrias de bens de consumo, supermercadistas interessados em conquistar mais competitividade e por conseqüência a vida de milhões de consumidores que se abastecem dos mais diversos produtos para os seus lares nesses pontos de venda. No levantamento de dados para esse trabalho, foi possível verificar a necessidade de mais estudos sobre o tema, que hoje se resumem a poucos artigos e livros especializados. E que este material seja produzido constantemente, de forma a acompanhar e apoiar esse movimento nos próximos anos, que devem presenciar sua consolidação em todo o Brasil.

Bibliografia

DE MARCHI, Célia. As Centrais vão à luta. Super Varejo, São Paulo, edição 53, p. 20-24, Outubro 2004.

KUMAR, Nirmalya. Marketing como estratégia. São Paulo: Campus, 2004.

PARENTE, Juracy. Varejo no Brasil. São Paulo: Atlas, 2000.

RANDALL, Geoffrey. Trade marketing strategies. London: BH, 1994.

SOUZA, Marcos Gouvêa de. Centrais de Negócios. São Paulo: Edições Inteligentes, 2004.

SOUZA, Walter. Redes crescem e investem em gestão. SuperHiper, São Paulo, edição 357, p. 64-73, Setembro 2005.

VICO MANAS, Antônio. Gestão de Tecnologia e Inovação. São Paulo: Editora Érica, 2001.

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